A Unicamp e seus
vínculos sociais
Carlos Henrique de Brito Cruz
(artigo publicado
no Correio Popular em 19 de Abril de 2002)
A vocação internacional da Unicamp, decorrente do caráter
sem fronteiras da ciência que produz e das relações que cultiva em todo o
mundo, não impede que ela tenha vínculos regionais muito fortes. O elo mais
visível dessa cadeia de relações com a sociedade que lhe está mais próxima é o
do atendimento de saúde, que compreende centenas de especialidades clínicas e
cirúrgicas distribuídas por várias unidades como o Hospital das Clínicas, o Centro
de Atenção Integral à Saúde da Mulher, o Hospital de Sumaré, o Hemocentro, o
Gastrocentro, o Centro de Pesquisas em Reabilitação e o Centro de Pesquisas em
Pediatria.
A importância da área médica da Unicamp como referência
para a sociedade campineira se estende, há mais de duas décadas, à população de
outras 90 cidades do interior paulista e de estados vizinhos, que aqui vem
atraída pela excelência dos serviços oferecidos de par com a gratuidade
assegurada pelo Sistema Único de Saúde, o SUS.
O alto interesse social dessa área tem seu correspondente
histórico, pois foi justamente a luta pela conquista da Faculdade de Ciências
Médicas, empreendida pela sociedade civil de Campinas ao longo da década de 50,
que terminou resultando no projeto de uma universidade inteira, materializado
nos anos 60 pelo professor Zeferino Vaz, fundador da Unicamp.
É pouco provável que aqueles pioneiros da fase
embrionária da Unicamp, a cujos nomes ainda não se fez a devida justiça,
estivessem cônscios do poder multiplicador de seu sonho original. Seja como
for, eles deram partida a um projeto ambicioso — o de uma instituição moderna e
congruente de ensino superior — que pela primeira vez no país escapava à
tradição do crescimento cumulativo de unidades; e que se mostrou apto, desde o
início, à geração de conhecimento novo.
Ao conjugar exemplarmente o ensino, a pesquisa e a
prestação de serviços, a Unicamp transformou-se logo num importante fator de
atração de investimentos para Campinas. De um lado, criou condições objetivas
para que se instalassem no seu entorno outras instituições científicas como a
Fundação CPqD, o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, a Embrapa e o atual
Centro de Pesquisas Renato Archer. De outro lado, passou a formar profissionais
altamente qualificados nas diferentes áreas do conhecimento, com densidade
suficiente para dar às empresas de alta tecnologia condições plenas de se
instalarem na cidade e na região, como de fato aconteceu.
Muitas dessas empresas se originaram nos próprios nichos
tecnológicos da universidade e prosperaram fora dela, fruto do esforço
empreendedor de seus ex-alunos ou de pesquisadores que buscaram aliar a geração
de conhecimento à produção de riqueza. O florescimento de empresas de base
tecnológica a partir da pesquisa científica desenvolvida na fronteira do
conhecimento, como é o caso de Campinas, é um fenômeno novo no Brasil que só se
tornou possível graças ao constante fluxo de profissionais formados na
universidade pública — no caso, a Unicamp. Somente o grupo de 12 empresas geradas
a partir do projeto de comunicações óticas de seu Instituto de Física, ao lado
de outras que emergiram das faculdades de Engenharia de Alimentos, de
Engenharia Elétrica e de Engenharia Mecânica, do Instituto de Biologia e do
Instituto de Computação, entre outras unidades, emprega várias centenas de
pessoas e soma um faturamento anual que supera os 600 milhões de reais — o
equivalente ao orçamento da Unicamp.
A conjugação desses fatores
complementares — capacidade de gerar conhecimento, abundância de mão-de-obra
qualificada e presença de um forte setor produtivo — fez de Campinas um dos
mais promissores pólos de atração de desenvolvimento tecnológico do mundo, como
aponta um recente estudo da ONU. A Unicamp se orgulha de ter contribuído para
isso e está consciente de que, para que essas realizações tenham seqüência e
sejam reproduzidas, cabe-lhe continuar dedicando-se com afinco ao avanço do
conhecimento nas ciências, nas humanidades e nas artes, mantendo, ao mesmo
tempo, padrões de ensino capazes de assegurar a formação das lideranças
intelectuais de que o Brasil necessita.
Carlos
Henrique de Brito Cruz, diretor do Instituto de Física “Gleb Wataghin” da
Unicamp e presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(Fapesp), toma posse hoje como reitor da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp).